Há cerca de 20 anos acompanhando e trabalhando em mudanças de gestão em empresas de diferentes setores, o consultor Robson Gouveia acredita que as companhias têm “mentalidades”. E é justamente isso que, muitas vezes, faz a diferença entre o sucesso ou o fracasso de uma organização. Para ele, essa mentalidade que se manifesta nas empresas é fruto, principalmente, das mentalidades das lideranças. E é aí que está a mudança necessária nas companhias, diz Gouveia, que precisam mudar de uma mentalidade “fixa” para uma mentalidade “de crescimento”. Gerente de Projetos do Lean Institute Brasil, entidade sem fins lucrativos que há 18 anos dissemina no país o sistema lean, filosofia de gestão inspirada no modelo Toyota, Gouveia, que dará um treinamento em São Paulo sobre “Liderança Lean”, nos dias 14 e 15 de março, explica, na entrevista a seguir, as diferenças de mentalidades que acontecem nas organizações.
Uma empresa tem “mentalidade”? Qual a importância disso numa companhia?
Sim, uma empresa tem mentalidade, que é o resultado das mentalidades das pessoas que compõem a organização, da forma como elas pensam. O que geralmente predomina é o conjunto das mentalidades dos líderes, obviamente. E fica cada vez mais claro que o fracasso ou o sucesso de uma empresa está totalmente ligado à mentalidade desses líderes, à forma como eles pensam na organização.
E quais são as principais diferenças de mentalidades que há nas empresas hoje?
Não há uma simples e única resposta. Mas há uma diferença evidente entre os líderes que pensam que já sabem tudo e os que aprendem e ensinam continuamente. Essa é uma diferença de mentalidade fundamental. Pessoalmente, defendo uma mentalidade organizacional direcionada para o experimento, para o aprendizado. O verbo que deveríamos flexionar mais na empresa é o “experimentar” e não tanto o “implementar”.
Qual é a típica mentalidade do líder mais direcionado ao aprendizado?
É aquela mentalidade do líder que se sente parte do problema. Que se envolve para entender quais são as dificuldades. Que não se contenta com análises superficiais. Que busca as causas raízes e não aceita fórmulas prontas. Que é presente onde ocorre a produção de valor. Que aprende e ensina juntamente com as pessoas. Ou seja, é o líder típico do sistema lean de gestão.
É difícil mudar a mentalidade empresarial não direcionada ao aprendizado?
Sim, mas é possível. Conheço líderes organizacionais brilhantes, com formação nas melhores universidades e grande capacidade de execução, mas que apesar desses atributos fracassaram ou desistiram porque pensam de uma forma ultrapassada. Há um livro fundamental sobre isso que é “Mindset – A nova psicologia do sucesso”, de Carol Dweck, que explica que há basicamente dois tipos de mentalidades. A “fixa”, daquelas pessoas que acham que sabem tudo. E a “de crescimento”, que é daquele tipo de pessoa que acredita que o sucesso vem da aprendizagem constante. As de mentalidade “fixa” são difíceis de mudar, pois não admitem facilmente seus erros. Querem que tudo dê certo da primeira vez. Foram excessivamente elogiadas e cortejadas pelas suas capacidades intelectuais, seus sucessos e conquistas. Tudo isso as levaram para um individualismo exagerado e a se fecharem para novos aprendizados. Já as de mentalidade “de crescimento” reconhecem seus erros. Aprendem com eles. Isso faz toda diferença numa empresa.
Por quê?
Porque elas ficam entusiasmadas com a possibilidade de seguir aprendendo quando algo dá errado. E aí encontram as soluções. E seguem aprendendo e encontrando soluções. E isso provoca uma evolução extraordinária na empresa. Sua confiança não está na capacidade intelectual, mas, sim, na dedicação ao experimento, ao aprendizado. Não é que ficam felizes por fazerem coisas erradas, mas ficam felizes quando descobrem que poderiam fazer diferente, com resultados melhores. Quem tem uma mentalidade “de crescimento” reconhece que a sua inteligência é construída com o tempo e constantemente. Quem tem a mentalidade “fixa” acha que o seu QI é para sempre. E pensa que quando erra isso seria uma comprovação de que não é tão inteligente. Isso faz com que muitos se isentem de tentar, pois não valerá a pena se falhar.
Como mudar essas mentalidades numa empresa?
Confesso que não é um trabalho fácil. Ele depende do “querer” antes do “fazer”. Mas é perfeitamente possível a pessoa mudar uma mentalidade “fixa” para uma “de crescimento”. A parte mais gratificante do meu trabalho, em diferentes projetos é observar as pessoas mudarem nesse sentido. O simples fato de refletir sobre tudo isso, de distinguir como pensam e se comportam as pessoas que têm mentalidade “fixa” das que têm mentalidade “de crescimento”, já pode impulsionar uma transformação de sucesso. Mas não basta só refletir. É preciso ter novos hábitos, novas atitudes. Principalmente se você for um líder.
Que atitudes é preciso mudar para se ter uma mentalidade “de crescimento”?
Por exemplo, o líder deve se envolver pessoalmente com os projetos, com o trabalho. Quero dizer, ele precisa estar mais presente no gemba, no local onde as coisas acontecem, entendendo os obstáculos, dando o apoio necessário e estimulando as pessoas. Ficar preso a um “roteiro” de trabalho é também uma mentalidade “fixa”, uma zona de conforto. É preciso querer o aprendizado contínuo, estando aberto a novas formas de se executar as coisas. Isso significa ser sempre um aprendiz: estar mais aberto e com uma escuta ativa para novos aprendizados. E, principalmente, pensar que a mudança começa em você mesmo, em nós mesmos. Se você percebeu que tem uma mentalidade fixa já é o primeiro passo para tentar mudar isso. E mudar não é difícil. No fundo, tudo muda o tempo todo. Para não mudar e permanecer parado é preciso, muitas vezes, fazer um grande esforço. Então, é possível mudar a mentalidade das pessoas e, assim, mudar a mentalidade da empresa.
Website: http://www.lean.org.br